A receita é simples e o resultado garantido. Junta-se um crédito à habitação, de preferência indexado a uma taxa instável, a um crédito para o carro e a um empréstimo para as férias. Vai ao lume numa altura de contracção económica e tempera-se com um novo crédito para ajudar a pagar os anteriores. O resultado pode ser apreciado mensalmente nas estatísticas do Banco de Portugal, que ontem avaliou o crédito malparado nos níveis mais elevados desde que há registo, Dezembro de 1997. Segundo o Boletim Estatístico de Junho, atingiu-se em Abril o valor recorde de 3,38 mil milhões de euros cuja cobrança é duvidosa, o que significa um acréscimo impressionante de 34% face ao homólogo. Feitas as contas, 2,54% do total de crédito concedido pelos bancos a particulares não está a ser pago. Mais de metade desta dívida (1,75 mil milhões) corresponde a crédito contratado para a compra de casa, que é normalmente a última prestação a ser abandonada em caso de dificuldades.
A conjuntura explica muito do incumprimento (aumento do desemprego...) mas a tomada de riscos por parte dos bancos parece não ter tido em devida conta o risco geral e o risco profissional. Agora, imaginem o que seria se a Euribor se tivesse mantido aos níveis de Setembro de 2008. A situação seria "bem mais negra", em particular para aqueles que estão habituados a transformar "os desejos em realidade" com base exclusivamente no crédito.
Uma receita que muitos de nós não gostariam de experimentar.. As poupanças não são eternamente duráveis, logo deve ser tida em conta a possibilidade de ocorrência de situações imprevistas, como a subida das taxas de juro. Há, ainda, que comprar e consumir conforme as nossas possibilidades e não conforme as expectativas e preferências dos outros.