A corrupção e a democracia

Publicada por José Manuel Dias


Os homens são atormentados pelo pecado original dos seus instintos anti-sociais, que permanecem mais ou menos uniformes através dos tempos. A tendência para a corrupção está implantada na natureza humana desde o princípio. Alguns homens têm força suficiente para resistir a essa tendência, outros não a têm. Tem havido corrupção sob todo o sistema de governo. A corrupção sob o sistema democrático não é pior, nos casos individuais, do que a corrupção sob a autocracia. Há meramente mais, pela simples razão de que onde o governo é popular, mais gente tem oportunidade para agir corruptamente à custa do Estado do que nos países onde o governo é autocrático. Nos estados autocraticamente organizados, o espólio do governo é compartilhado entre poucos. Nos estados democráticos há muito mais pretendentes, que só podem ser satisfeitos com uma quantidade muito maior de espólio que seria necessário para satisfazer os poucos aristocratas. A experiência demonstrou que o governo democrático é geralmente muito mais dispendioso do que o governo por poucos.
Aldous Huxley (1894-1963), in "Sobre a Democracia e Outros Estudos"
O texto supra caracteriza, de forma muito clara, um dos maiores problemas das democracias. O Grupo de Trabalho sobre Corrupção da OCDE, no âmbito das avaliações periódicas, recomendou a Portugal que seja mais pró-activo na detecção, investigação e procedimento judicial relativo à corrupção, bem como a adopção de medidas no sentido de rejeitar e proibir as despesas não documentadas e as despesas confidenciais, de modo a reforçar a competência da administração fiscal na detecção de situações de corrupção.
Neste enquadramento o Guia de Boas práticas " Prevenir a Corrupção» editado pelo Ministério da Justiça (ver aqui), tem de ser considerado como uma iniciativa meritória por «fornecer aos cidadãos informação acessível e clara que os habilita a participar em melhores condições na luta contra a corrupção».

9 comentários:

  1. Esther disse...

    No mínimo uma ferramenta que ajudará a evitar a nociva corrupção,através da informação.. parabéns!

  2. Anónimo disse...

    Há meramente mais, pela simples razão de que onde o governo é popular, mais gente tem oportunidade para agir corruptamente à custa do Estado do que nos países onde o governo é autocrático.

    Certamente uma afirmativa verdadeira, e, por isso mesmo, atual.

    Ao meu mer, e isso é uma opinião de um simples cidadão, a corrupção relativa a desvio de verbas, por exemplo, deveria ser tratada como furto, e não como um simples desviode conduta. É uma amenidade que o corrupto-ladrão não merece sofrer.

    Corrupção é um termo tanto quanto brando. Em relação aos outros tipos, acredito que penas mais altas poderão ajudar.

    Em nosso diploma penal, existem crimes como corupção passiva, ativa, mas não são aplicados em relação aos parlametares. Somente o são em relação a membro não politicos da Administração.

    Eu li o arquivo, e a ligislação do Brasil e de Portugal são muito semelhantes.

    Entretanto, a corrupção em sistemas democratico é que me preocupa. Não será que estes representantes não nos representam de verdade? Será que nós tambem não cometemos pequenas "corrupções" no nosso dia a dia?

    Muitas vezes sim, com a diferença que as nossas são cometidas em uma esfera menor de danos. Eles, por outro lado, cometem corrupção com uma potencialidade de danos muito maior, e com dinheito dos outros.

    Mas na realidade, penso apenas que são diferenças apenas de grau, e não de genero, ou seja, ambas devem ser punidas como corrupção.

    Todo e qualquer desvio de conduta deve ser responsabilidade. Ambros no rigos da lei, sem provilegios e benesses.

    Do contrario, se apenas certos tipos de corrupções forem punidas, estaremos alimentando ainda mais este sistema.

    Abraços, Guilherme.

  3. Terra e Sal disse...

    Mais um belo tema que aqui nos trouxe meu Caro José Manuel Dias, e continuo a insistir no quanto seria interessante para todos nós, que outros pensamentos e de outra índole aqui nos trouxesse.
    Conheço-o suficientemente para saber que é uma pessoa atenta e de capacidades múltiplas para se cingir apenas e só a vertentes pedagógicas e culturais que não agitam as “águas,” que estagnadas como sabe, são um mal social.
    Bem, não vale a pena pregar aos “pássaros,” e quem sou eu para pregar junto da sua pessoa!

    Sobre o seu post:
    É indesmentível que a corrupção e o tráfico de influências (para mim são iguais) sempre existiu e existe na política, e em todos os partidos políticos. Na minha opinião quem os pratica são tão criminosos como aqueles “pés descalços” que roubam aí num sítio qualquer, um velho indefeso.
    Fazer “manigâncias” com o erário público que é de todos nós, é roubar gente indefesa que não tem tempo nem conhecimentos suficientes, para se defender.
    Mas isso, infelizmente, é já tradicional, portanto, cultural. Aceitamos isso com a maior das naturalidades. Somos da mesma génese dos latino-americanos. Muitos, até pensam que isso é um ritual das doutrinas partidárias, e lá no fundo da sua consciência também corrompida esperam sempre uma oportunidade e beneficiar do sistema “implantado” É vulgaríssimo ouvirmos os pais a procurarem alguém que tenha “conhecimentos” e possa dar uma ajuda para o seu filho desempregado.
    Somos um país de pecadores!…

    Vemos através de muitos partidos políticos que quando chegam ao poder, seja numa autarquia ou mesmo no Estado, que uma coisa sempre acontece: Uma distribuição de lugares a quem tiver o cartão partidário ou até mesmo por se ter destacado na propaganda eleitoral.
    Além desses, temos os grandes empresários, na sua maioria “apartidários.” Sempre subsidiaram partidos políticos, no entanto, nas suas empresas, praticam ordenados de miséria para com aqueles que lhe dão a riqueza. Muitos desses empresários que disponibilizam milhares ou milhões de euros pelos partidos, e que até são “apartidários” todos sabemos que nem são beneméritos nem mecenas nenhuns, pois não têm estrutura moral nem para uma coisa nem para a outra.

    Na minha opinião os seus contributos são a corrupção dos partidos e até dos eleitores.
    Os eleitores, mais humildes e ignorantes, até vão comer com esse dinheiro um porco assado no espeto ou receber uma qualquer bugiganga, a quem depois como pagamento entregam o seu voto, ou seja, o seu futuro e o dos seus filhos. Depois andam dois ou três anos a lamentarem-se e a protestarem, a fazerem manifestações por tudo o que é sítio, mas ciclicamente voltam ao mesmo, vendem-se cegamente como o Judas.
    Muita ignorância e falta de Educação meu Caro JMD. Só isso, apenas e só!

    Depois, os governantes, quando deixam de o ser, sejam azuis, amarelos ou vermelhuscos, nunca têm problemas de “trabalho” ou melhor, de emprego. No interregno, até à próxima governação, não faltam Instituições e Empresas, que os “requisitam” e lhes pagam ordenados milionários, para não fazerem nada.
    Claro, que isso, tal e qual como nas campanhas eleitorais, são investimentos a médio prazo, seja das Instituições, seja das Empresas, pois vão render juros elevadíssimos, pagos por todos nós, mesmo por aqueles que nem pão têm para dar aos filhos.

    Bem, como sempre já vou longe de mais,e tinha ainda tanta coisa para dizer, mesmo sobre os poderes totalitários, mas faz-se tarde,embora goste de falar consigo, e o tema, como sempre e que hj aqui nos trouxe, é interessantíssimo.

    Pena não podermos vaguear os dois pelo mundo da corrupção e do tráfico de influências, mesmo por aqueles sítios que não são conhecidos e nem sequer pensamos neles, mas claro, para isso teríamos cada um de se enfiar num preservativo, para termos a certeza de não nos conspurcarmos…
    Desculpe a imensidão de caracteres. Para mim são de borla é certo. E eu sempre sou um esbanjador deste pobre capital, mas o meu amigo não é obrigado a aturar-me.
    Um abraço José Manuel Dias, gostei de aqui estar.

  4. veritas disse...

    Aldous Huxley, gostei da evocação do autor que me maravilhou com "Admirável Mundo Novo".

    Bjs. Boa semana.

  5. susana disse...

    O problema é que os próprios cidadãos são corruptos, ou então deixam passar só para que não os chateiem!
    beijos miss

  6. Porfirio Silva disse...

    É um problema central que tem de ser atacado sem hesitações. E sem ceder à hipocrisia: esse Guia de Boas Práticas editado pelo Ministério da Justiça foi criticado por pretensamente fazer parte de uma campanha a fazer da delação, que seria supostamente mais um indício do autoritarismo do presente governo de Portugal. Porquê? Porque lembra que os funcionários têm o dever de denunciar a corrupção quando dêem de caras com ela e por dizer como podem eles cumprir esse dever. Parece evidente que se trata de um dever cívico, de uma questão de honestidade e de lealdade para com a cidadania. Mas mesmo esse valor está corrompido pelo actual vício de confundir a necessária autoridade do Estado com autoritarismo: e esse vício é, em si mesmo, um princípio de corrupção, porque a corrupção é a doença do "vale tudo".

  7. mixtu disse...

    por vezes< mais que a corrupção o mal está no "conhecido" e depois vêm os favores...

    mas excelente iniciativa

    abrazo europeu

  8. Rainha de Copas disse...

    o silencio é ou gera a corrupção?


    obrigada pela visita. seja sempre bem vindo ao reino.

  9. José Manuel Dias disse...

    Gostava de partilhar convosco uma situação que ocorreu comigo. No início dos anos 90, contactei, por razões profissionais, com um empresário sueco radicado em Portugal. Ele confidenciou-me que havia duas coisas que o surpreendiam nos portugueses: primeiro, a facilidade com que se pára na rua para conversar com um conhecido, negligenciando compromissos profissionais, segundo, a frequência com que ouvia pessoas dizer que tinham "fugido ao Fisco". Se quanto à primeira, a mudança não é fácil, por fazer parte da nossa idiossincracia acreditar que "tudo se resolve", em relação à outra, podermos dizer que muito mudou. Para o sueco, a fazer fé nas suas palavras,nunca passaria pela sua cabeça não cumprir com as obrigaçoes fiscais mas se, porventura, tal acontecesse nem à mulher ousaria dizer. Não pagar os impostos devidos tem uma censura social correspondente ao acto de roubar, porque, na prática, equipara-se, nas suas palavras, "a roubar a sociedade".
    O combate à corrupção para ser eficaz deve implicar, de igual modo, uma severa censura social ( para além das penas previstas na Lei) em relação a quem a pratica. Ora essa postura, depende de todos nós cidadãos.
    Já agora, deixo o link para um post antigo sobre esta matéria

    http://cogir.blogspot.com/2006_05_01_archive.html

    Muito obrigado pelo vossos comentários.