A selecção de uma boa campanha

Publicada por José Manuel Dias


No ano passado, apresentei num congresso académico um trabalho de investigação comparando a emissão desse dia na RTP1 com um texto de 1849, de Thomas de Quincey, no qual este ensaísta britânico usava a simbologia da viagem da diligência dos correios atravessando uma multidão infinita nas ruas de Londres e depois por todo o país e levando consigo a notícia de mais uma vitória britânica na guerra contra Napoleão. As semelhanças simbólicas entre os dois documentos - um escrito e ficcional, o outro real e audiovisual - são enormes.
Depois do meu trabalho, julgo ser esta a primeira vez que a importância simbólica do “autocarro da selecção” é realçada publicamente. A campanha da Galp utiliza na sua plenitude as possibilidades desta peculiar e imensa simbologia.
Começa por tomar o autocarro literalmente como meio de transporte, que se move com combustível da empresa, assim criando uma ligação umbilical entre tudo o que mostra e o anunciante. As menções à “energia positiva” decorrem daí com naturalidade.
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O anúncio televisivo da Galp sugere um baixo nível de expectativas, no que é “scolarimente” correcto. De facto, uma das mensagens da narrativa é a de que ter (ou melhor, “termos”) chegado à fase final já é uma vitória: o autocarro chega à Alemanha com o esforço de “todos nós”. O único feito do anúncio é o dos “portugueses” – a multidão que empurra o autocarro pela Europa fora. Os jogadores são deuses no pedestal (o autocarro) e se deixam empurrar, sem o mínimo esforço, sem darem por isso, o que faz da multidão também uma entidade sobrenatural, acima deles (a nação). O anúncio não “exige” mais vitórias à Selecção,não lhe exige nada, mas fica implícito no final, quando os jogadores saem do autocarro e a multidão já não está lá, que eles ficam entregues a si mesmos, o “resto” compete-lhes, “nós” ficaremos com eles assistindo aos jogos pela TV.
Eduardo Cintra Torres, no Jornal de Negócios, aqui.
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